terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O meu contrato social

Conversava um dia desses com meu amigo Drailton Diniz. Dizia que nos últimos dias voltava a me interessar sobre assuntos antigos como “contrato social”. Creio que o tema surgiu quando fui interpelado por meu vizinho a fazer uma mudança em meu apartamento, que julgo ser despropositada. Como ele tem insistido e isso já virou pauta de reunião de condomínio, parei pra pensar nos “comos” e nos “porquês” de nos reunirmos em sociedade.
Eu sempre digo a Lídia, minha esposa, que me vejo na velhice, se os anos vierem, em um lugar isolado. Cabe apenas poucos amigos e familiares mais próximos. Nada muito novo. Daí me surpreendi quando descobri que o pai dela já faz isso há uma década. Viver e conviver são muito complicados. O ser humano é cheio de ações inexplicáveis, ou para amenizar, pelo menos mesquinhas. E chegar aos 60, 70, 80 anos buscando entender as carências de alguns e as maldades de outros não vai dar. Vou preferir o Estado Natural de meus netos.
No contrato social, você abre mão de seus direitos em busca de paz. Mas que paz pode ser alcançada quando uma pessoa pede a você um direito que você acha que ela não tem? Para Hobbes, a tranquilidade viria com as normas estabelecidas pelo Estado. E quando as normas não satisfazem e sequer há uma legislação para fazer uma pessoa deixar de existir na sua vida?
A Psicanálise vai dizer que todo mundo deseja roubar e matar. Aprende a frear os impulsos e se civilizar, em nome de uma boa convivência com o outro. Ou seja voltamos ao maldito contrato social. Um contrato assinado entre eu, o malandro do leiteiro, o mal-educado do motoqueiro, o vizinho que me faz um pedido inquietante e até o ladrão, para que eu não morra. Um contrato que eu cumpro, descumpro, entendo e não entendo e que estou sempre indignado quando mostram que nem sempre vale a pena estar nele, no entanto você não sabe onde revogá-lo.
O mesmo Hobbes diz que você assinou o contrato porque todos nós somos naturalmente invejosos e maus. Que vivíamos num clima de guerra tão terrível, tendo que tomar o dos outros e se proteger para que ninguém roube de você, ou pior, te mate. E esse medo atrapalhava qualquer produtividade.
Penso: será que minha inquietação é medo de que meu vizinho me mate ou me roube. Eu fico com a proposição de que na verdade é a falta de saco – já tão cedo – de querer entender que carências ou maldades existentes num homem de 40 anos, três filhos, que foi virar meu vizinho e me pede coisas que julgo não ter sentido nenhum.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

À Espera de um Leviatã

São poucos os jornalistas em Alagoas que podem afirmar estar seguro em sua profissão. Não quero entrar na questão se se faz jornalismo ou não no Estado, mas de segurança em trabalhar.
E quero logo taxar o seguinte: o ser humano adoece se está sob o estresse permanente. E quando não se tem segurança, se adoece um pouco a cada dia. É como fumar, ninguém sabe quando, mas sabe que vai adoecer um dia quando se convive com este hábito.
O jornalismo é um vício, é uma paixão. Ele te consome de várias maneiras, mas te consome.
Vivemos tempos de instabilidade. Após décadas de afirmação, entre 70 e 90, passamos por tempos que dá vontade de cantar um reggae, na balada de "vamos, amigo, lute, que a gente acaba perdendo o que já conquistou".
Após a perda do diploma, a cama d'água da inexistência da Lei Geral de Imprensa, as contantes ameaças às empresas de comunicação, a sistemática demissão de profissionais nas redações e falta de reserva de mercado, com a entrada descontrolada de centenas de recém-formados no mercado... penso que Hobbes estava um pouco certo: "Onde não existe governo, haverá uma competição que leva ao medo, à inveja e à disputa. E com esta descofiança, perde-se a segurança de confiar no outro e na busca pela glória, derruba-se o outro pelas costas".
Estamos à espera de um Leviatã.

Almas Grandes e Pequenas - Cony

*Abro espaço para uma coluna de Carlos Heitor Cony

Li em algum lugar que um cidadão francês, antes de se suicidar, deixou um bilhete explicando o seu gesto: "Estou cansado de abotoar e desabotoar os botões de minhas calças". Evidente que ainda não haviam inventado o zíper.
Outro cidadão francês, este de ficção, ao tirar as calças antes de dormir, descobriu que estava na idade da razão" (estou citando Sartre, primeiro volume da trilogia, "Os Caminhos da Liberdade").
Vargas deixou uma carta, Raul Pompeia um aviso. Ambos alegaram motivos de honra, o presidente por causa de uma crise política, o escritor por causa de uma infâmia que publicaram contra ele. Em compensação, não consta que Judas tivesse dado qualquer explicação pelo fato de se enforcar: não chegou a aproveitar os 30 dinheiros de sua traição.
Já citei por aí um conto de Gorki em que dois vagabundos moram num quarto miserável. Um deles sai para fazer qualquer coisa na rua. Quando volta, encontra o companheiro pendurado numa corda. Antes de se enforcar, deixou um bilhete dizendo que lhe "faltara um truque" para continuar vivendo.
Werther matou-se porque se apaixonara pela mulher de seu melhor amigo. Anna Karênina atirou-se à frente de um trem porque abandonara o marido e sentia falta de seu filho. Luíza, de Eça de Queiroz, também se matou por causa de seu primo Basílio e estava sendo chantageada pela empregada. Isso tudo sem falar em Emma Bovary, que se envenenou com as drogas de seu marido, o médico Carlos Bovary. Seus motivos foram além do adultério, sem saber, ela criou o que hoje chamamos de bovarismo.
Comerciantes falidos, amantes traídos, artistas fracassados também recorrem à solução extrema. "Tudo vale a pena se a alma não é pequena" (Fernando Pessoa).

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Todo dia

Sou grande admirador de uma propaganda da Natura, de título "Todo dia - Rotina". Com lindas imagens, belíssima narração e uma encantadora poesia, o comercial fala da beleza da rotina. Encerra com a frase: "Toda rotina tem sua beleza".
Bem, esse é o meu desafio. Pra mim, todo dia tem que ser diferente. Adoro coisas novas. Adoro comer algo novo todo dia, assistir algo novo todo dia. Ler o livro tem que ser de uma vez. Se tiver com vontade de escrever algo, tem que aproveitar a inspiração.
Sou fã do cheiro do livro novo, do carro novo, gosto de ver coisas novas, como se o meu alimento espiritual exigisse sempre distintos estímulos.
Daí vem a rotina. E por mais que eu aprecie e exija padrões e cuidados (a ponto de minha esposa me chamar de 'cri-cri', oh! trauma!!), me deparo com o imenso dragão assustador chamado rotina.
Acordar todos os dias no mesmo horário, forrar a cama, tomar banho, escovar os dentes, passar desodorante, perfume, se vestir, se pentear, beber água, tomar café, tirar o lixo, lavar os pratos, desligar os aparelhos, trancar a porta, descer com a mochila, conferir se não esqueceu nada, ligar o carro, trabalhar, voltar pra casa, varrer a casa, passar o pano, fazer a comida, lavar os pratos... e você sabe que não estou nem citando metade. Não parou pra pensar que isso é todo dia? Porque se não fizer isso todo dia...
É sério! O meu problema é com repetição. Gosto do futebol por saber que não dá pra prever nem se terá vencedor. Academia é pura obrigação. Escola, trabalho sempre me entrou pelo modo automático. Eu escolhi o jornalismo por imaginar que todo dia eu teria que matar um leão, novo, diferente, desafiador. Mas depois vem a rotina de ter tudo diferente.
Meu ideal de vida é meio dadaísta. A gente colocaria tudo isso num saco, sortearia as ordens e descartaria sempre algumas coisas... mas não funciona assim. Enquanto isso, procuro a beleza de olhar cada dia, de ver o sol nascer todos os dias e se surpreender todos os dias. Acho que vai dar certo porque tenho uma pessoa e em breve duas que podem me ajudar a matar o dragão. Feliz 2012!